sexta-feira, 22 de julho de 2011

A REINTEGRAÇÃO E REABILITAÇÃO DO POLICIAL MILITAR DEPENDENTE QUÍMICO É FOCO DO PAISPM

O dedilhado no violão puxa o coro. A música é Amigos para Sempre, sucesso da década de 80. A canção agora embala a despedida do policial E.D. do Programa de Atenção Integral a Saúde do Policial Militar (Pais-PM). Ele conquista hoje sua alta e comemora três anos e meio de abstinência. Aos que continuam em tratamento, a vitória do colega é exemplo de que a reabilitação é possível. Goiás é pioneiro no combate ao uso de entorpecentes dentro da corporação e na reabilitação de dependentes. O Governo do Estado oferece tratamento completo para policiais e familiares. O índice de recuperação é de 50%, cerca de 20% acima da média nacional.
O programa coleciona inúmeros sucessos e é referência nacional na reabilitação de policiais militares dependentes químicos. Segundo a Organização Mundial de Saúde, devido a natureza de seu trabalho, os policiais militares estão no grupo de risco de pessoas propensas a desenvolver esse tipo de dependência devido à natureza das atividades que exerce. O Pais-PM existe há 15 anos e ganhou nova regulamentação neste ano. Ele tem servido como modelo a outros estados, como é o caso de Minas Gerais e Tocantins, que implantaram o programa após conhecer o projeto goiano.
Neste ano o programa recebeu reforço do Governo Estadual. A portaria n° 001381 de 13 de abril de 2011 modificou a estrutura do projeto e fixou a responsabilização do comandante do batalhão no encaminhamento do policial para tratamento. Ele pode inclusive responder criminalmente por negligência ou omissão. ?A portaria determina que todos os comandantes de unidade e qualquer policial ? desde o soldado ao coronel ? que tenha conhecimento de que o colega está fazendo uso de qualquer substância psicoativa pode buscar assistência no Departamento de Serviço Social. É dever do comandante encaminhar o policial?, explica a assistente social especialista em toxicologia pela UFG e chefe do departamento de serviço social do Comando de Saúde da PM, major Vânia Maria Rodrigues Alencar (foto).
A major ainda revela que a denúncia de que o policial faz uso indevido de substâncias psicoativas também pode ser feita por qualquer pessoa da comunidade. Para isso é importante que o denunciante ligue no telefone (62) 3235-6157 em horário comercial e informe o nome do PM (pode ser o nome de guerra escrito na farda). A partir disto, a junta médica da PM vai investigar o caso e avaliar o policial. Caso comprovada a dependência química ele é encaminhado para o departamento de serviço social da Polícia Militar onde lhe é apresentado o programa.
Pais PM segue a política nacional sobre uso indevido de drogas e por conta disso o usuário tem a opção de fazer ou não o tratamento. No entanto, quando o Comando de Saúde da PM apresenta a proposta de recuperação prevista no programa para o policial dependente, assim como a metodologia de trabalho, a corregedoria é informada. Isso ocorre porque a partir deste momento o PM está consciente de sua doença e se a opção por não se tratar afetar seu desempenho profissional ele pode responder administrativamente e criminalmente, dependendo da circunstância.
Caso ele faça a adesão ele assina um termo de inclusão, se não aceitar ele vai assinar um termo de abstenção e se ele começar e não seguir rigorosamente a proposta de tratamento ele tem o direito de assinar o termo de desistência. E se ele fizer o tratamento e em dois anos ele estiver bem ele pode requerer a sua alta. O usuário é o único responsável pela prevenção da recaída, por isso a requisição da alta deve ser feita por ele. Caso comece o tratamento e não tenha compromisso com o mesmo, não assinando nenhum termo, a equipe de saúde o desliga do programa. O comandante e o corregedor são informados da decisão.
Reabilitação
A major Vânia Alencar alerta que a dependência química prejudica o desempenho das atividades laborais, mas principalmente gera problemas à saúde do policial. Além da incidência de diversas doenças, como a cirrose, pancreatite e AVC, há riscos de acidentes, como afogamentos, choque eletétrico ou acidente de trânsito. Ainda há aqueles que são excluídos da corporação. Segundo Vânia, a maioria dos policiais que infringiram a lei e estão presos faziam uso de alguma substância ilícita.
A exclusão da corporação e a incidência de algumas doenças ainda não representam o maior dano ao policial. Em muitos casos a dependência leva à morte. Foi o caso do marido de Selma Assis Magalhães, 42 (foto). José Ronaldo da Silva era soldado e tinha 31 anos quando morreu. Há 11 anos Selma participa do Pais PM e tenta superar a morte trágica do companheiro que utilizou durante mais de 25 anos álcool de forma desregrada.
O soldado atirou na própria filha dentro de casa e em seguida se matou. ?O Pais PM ajudou na recuperação da minha filha e me ajudou também. Você entra numa depressão que se não tiver ajuda não consegue sair. O pior de tudo foi assistir o suicídio. Eu e minha filha?, comenta Selma. Ela afirma que o marido se recusou a procurar tratamento e isso acabou com sua vida.
Essa experiência poderia ter se repetido com a família do cabo Antonio Maria da Silva, 46 (abaixo, com a esposa). Após servir por 30 anos, ele está há seis meses na reserva. Antonio percebeu que chegou ao fundo do posso durante um episódio que colocou em risco sua esposa e filhos. No auge de sua dependência por álcool, em que bebia 1,5 litro de pinga diariamente, a esposa Maria Socorro Santos Silva, 49, resolveu se separar. No meio da discussão ele começou a atirar para o alto dentro de casa. Ninguém se feriu, mas ele percebeu que aquele era o limite.
?Cheguei à conclusão que eu estava precisando de ajuda, que eu estava doente. Sou um alcoólatra em recuperação e estou cada dia melhor. Estou há 6 anos e 42 dias sóbreo e 2 anos e 6 meses sem fumar?, afirma. A esposa o acompanha em todas as sessões e conta que o programa mudou suas vidas. ?Eu vivi isso como um desespero. Porque você vê seu marido chegando de madrugada bêbado ou às vezes bêbado em casa brigando com os filhos, batendo nos filhos? E os filhos perdendo o respeito com o pai. Isso é muito difícil pra gente, não é fácil não?, relembra Maria Socorro.
E completa: ?A gente já estava separando. Não tinha mais diálogo entre nós. Agora somos uma família de novo. Nossos filhos estão formados e com o Pais PM a gente tem a terapia da música, tem os parceiros com quem a gente faz viagens. O programa dá um apoio total pro dependente?.
Metodologia
Pais PM é fundamentado em três eixos: O trabalho social de grupo, o lazer terapia e a psicoterapia. Enquanto o policial está em tratamento ele fica afastado das atividades laborais, não possui porte de arma de fogo e não pode dirigir veículo funcional. Para sua reintegração no trabalho é necessário que receba alta do programa. Ele requisita liberação médica e é avaliado pelo corpo clínico do Comando de Saúde, psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais. Também realiza o exame toxicológico.
O trabalho social de grupo ocorre semanalmente. Durante as reuniões ocorrem palestras sobre educação e saúde, dinâmicas, exibição de filmes e musicoterapia. Esta última é um dos momentos de maior integração do grupo. Membro da banda da PM, o subtenente Gilson Rodrigues de Oliveira integra a coordenação das reuniões. Seus dedilhados no violão puxam o coro de policiais em tratamento e familiares. Essa é uma das ocasiões em que os usuários que dividem angústias semelhantes e têm histórias de vida marcadas pelos problemas ocasionados pela dependência se unem em canções de motivação.
O Comando de Saúde também utiliza parceiros. Mensalmente ONGs e associações ministram palestras. Exemplo disso é a Associação dos Alcoólicos Anônimos, que realiza reunião uma vez por mês. Ainda há palestras com nutricionistas, dentistas, médicos e demais profissionais da saúde, abordando os impactos das drogas no organismo dos usuários.
O prazer da droga é substituído por atividades de integração familiar e com amigos. Essa é a tarefa do lazer terapia. Com base nisso, o programa busca resgatar o direito ao lazer do indivíduo. Na maioria das vezes, os policiais chegam ao PAIS PM endividados, com baixa auto-estima e com a relação familiar deteriorada. Por meio do programa ele tem acesso a viagens em grupo monitoradas, consegue se organizar financeiramente e resgata sua auto-estima. Caldas Novas, Fortaleza e Natal foram alguns destinos já visitados pelo grupo.
É no último eixo, a psicoterapia individual, que o paciente começa a refletir quais os momentos em que ele está recorrendo às substâncias psicoativas. É por meio dessa terapia individual que o dependente desenvolve o autoconhecimento e aprende a lidar com situações de risco e vulnerabilidade. O psiquiatra avalia qual o tratamento mais indicado para o usuário e caso seja necessária internação ele é encaminhado para a rede credenciada. Caso o tratamento seja ambulatorial, o dependente é atendido no Hospital da Polícia Militar.

http://www.paispm.com.br/?p=135

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